[N.113 | 2024]

Feliz aniversário mamãe

Maryse Condé

O aniversário de minha mãe era dia 28 de abril, data que nada jamais poderá apagar de minha memória. Era todo ano um acontecimento agendado com precisão como uma consagração. Na escola Dubouchage, onde ela ensinava havia vinte anos, suas alunas preferidas, pois ela tinha sua corte, recitavam-lhe elogios e entregavam-lhe um buquê de rosas, suas flores preferidas, em nome de toda a classe. Em casa, na hora do almoço meu pai lhe dava um presente, geralmente um colar ou uma pulseira que iria pesar ainda mais em sua caixa de joias. Às quatro horas da tarde, a sorveteira começava a ranger no pátio. Adélia, que resistia fielmente aos saltos de humor apesar de um salário miserável, servia o lanche para minha mãe e suas amigas perfumadas e embonecadas. Havia rosas em todos os lugares. Além do mais, diante desse canteiro, meus irmãos e irmãs maquiados e fantasiados encenavam uma pequena peça composta por eles, que tinham ensaiado no maior segredo. Então meu pai abria as garrafas de champanhe postas para gelar na véspera. Durante anos eu me contentei em ser uma espécie de mosca do coche, inoportuna para todos. Eu queria lamber a fôrma do bolo, girar a manivela da sorveteira. Eu me recusava a beijar as amigas da minha mãe. Mas me empenhava em cobri-la de beijos grudentos. Eu derrubava xarope de orchata no meu vestido. Bebia as sobras nos copos. Enfim, como dizia minha irmã Thérèse, a única da família que me tratava com alguma severidade, “eu fazia o que queria”. À medida que fui crescendo, esse papel de figurante não me contentava mais. Aos dez anos, quis chamar a atenção de minha mãe, merecer seus elogios por um gesto fora do comum.

Aqui talvez seja preciso tentar rascunhar um retrato de minha mãe. É uma tarefa que só pude tentar recentemente, minha mãe nunca dizia uma palavra sobre si mesma. Como ela não tinha nem irmãos nem irmãs, apenas alguns primos da ilha Marie-Galante que nos traziam tangerinas no Ano Novo, e como sua mãe tinha fechado os olhos antes que eu abrisse os meus, para mim era fácil imaginar minha mãe saída do limbo já adulta para dar à luz a minha legião de irmãos e irmãs.

Ela se chamava Jeanne Quidal. Minha memória guarda a imagem de uma mulher muito bonita. Pele de sapoti, sorriso iluminado. Alta, escultural. Sempre vestida com bom gosto, com exceção de suas meias-calças claras demais. Em La Pointe, poucas pessoas gostavam dela apesar de sua caridade incansável: ela alimentava dezenas de infelizes que vinham em busca de socorro todo domingo. Havia adquirido a reputação de uma figura lendária. Faziam circular seus comentários e julgamentos, sempre contundentes. Amplificavam seus gritos coléricos e seus ataques de fúria. Contavam como Jeanne tinha quebrado seu guarda-sol nas costas de um policial, culpado por lhe faltar com o respeito, segundo ela. Afinal, a base de sua personalidade era o orgulho.

Era filha de uma bastarda analfabeta que tinha deixado La Treille para viver em La Pointe. Vovó Élodie. Uma foto sobre o piano Klein mostrava uma mulata com um lenço, frágil, ainda mais fragilizada por uma vida de exclusão e de cabeça baixa “Sim, sinhô. Sim, senhora”. Minha mãe tinha crescido, portanto, humilhada pelos filhos do patrão, perto da horta das cozinhas nas casas burguesas. Seu destino natural seria cozinhar para os outros como sua mãe e ficar prenha do primeiro bugre que chegasse. Mas, desde a escola primária, a colônia, que nem sempre é cega, tinha notado sua inteligência excepcional. Graças a bolsas e a créditos educativos por mérito, ela foi uma das primeiras professoras negras. Convertida em bom partido, minha mãe logo foi cortejada. Ela poderia desejar se casar na igreja de véu e grinalda. No entanto, não se deixava enganar, sabia que muitos de seus pretendentes só estavam interessados em seu salário de professora da elite. Aos vinte anos, encontrou meu pai. Ele tinha 43 anos e a cabeça prematuramente grisalha. Tinha acabado de enterrar sua primeira esposa e estava sozinho com dois filhos pequenos, Albert e Serge. Apesar disso, minha mãe aceitou casar-se com ele. Apesar de não poder afirmar, eu desconfio que o amor pouco teve a ver com essa decisão. Jeanne não tinha afeto por esse viúvo responsável por dois filhos, já com artrite e enxergando mal atrás de seus grossos óculos de armação de tartaruga. Mas o quarentão, ambicioso de primeira, que prometia preencher sua vida, tinha construído uma casa de dois andares na Rue Condé e possuía um Citroën C4. Ele tinha pedido demissão da escola para se lançar aos negócios. Com um grupo de empresários do seu tipo, havia fundado a Caixa Cooperativa de Empréstimos, futuro Banco das Antilhas, destinado a ajudar funcionários. Na aparência, o casamento de meus pais foi a usual mistura de felicidade e infelicidade. Tiveram oito filhos. Quatro meninos. Quatro meninas. Perderam dois ainda pequenos, algo com que minha mãe nunca se conformou. Não lhes faltou dinheiro e viajaram muito. Foram até a Itália. Meu pai foi um marido fiel. Nenhum meio-irmão, nenhuma meia-irmã vieram pedir dinheiro para os sapatos da escola. No entanto, nada tirará de minha cabeça que meu pai não merecia minha mãe. Apesar de ele chamá-la constantemente de “meu tesouro”, ele não a compreendia e, além do mais, ela o assustava. Sandrino era categórico. Segundo ele, minha mãe era uma mulher insatisfeita e frustrada.

— O que você queria? — ele repetia. — Ela se vendeu a um velho. Aposto que ela não faz amor de maneira adequada há anos. Você foi um acidente.

Longe das aparências, em seu íntimo, imagino que minha mãe tinha medo da vida, égua sem cabresto que tanto havia maltratado sua mãe e sua avó. Um desconhecido havia violentado Élodie, cuja mãe havia, quinze anos antes, sido violentada por um dono de fábrica de Marie-Galante. As duas haviam sido abandonadas com sua montanha da verdade e seus dois olhos para chorar. Élodie nunca teve nada que fosse dela. Nem mesmo um quarto. Nem mesmo um bom vestido. Nem mesmo um túmulo. Ela dormia seu sono eterno em uma sepultura de seus últimos patrões. Consequentemente, o que assombrava minha mãe era vivenciar o que elas viveram. E, sobretudo, que a confundissem com uma pessoa qualquer, que não homenageassem a pessoa que se tornou pela força de seu próprio esforço. Ela aterrorizava minhas irmãs. Apenas Sandrino e eu a enfrentávamos. Quando eu era pequena, alguns de seus axiomas me deixavam enfurecida. Em especial aquele que ela me repetia com frequência, vendo minha propensão a procurar a companhia de Adélia:

— Você nunca fará nada de bom. As meninas inteligentes não passam seu tempo na cozinha.

Eu não podia entender que era seu modo de lamentar a distância que, ao longo dos anos, cresceu entre sua empregada e ela. As pessoas de La Pointe diziam que ela não tinha sentimentos e que havia magoado Élodie. Que ela não a deixava mais tocar em seus filhos, como se fosse uma pestilenta. Que tendo vergonha de seu lenço, ela a havia forçado a usar chapéu e a expor suas têmporas desnudas; por falar em crioulo, ela a havia forçado ao silêncio; por sua atitude de subalterna, ela a escondia toda vez que recebia visitas.

Aos dez anos, encorajada por minhas boas notas em francês, pedi para apresentar um texto composto por mim em um aniversário de minha mãe. Aceitaram, já que eu sempre podia tudo. Não pedi ajuda a ninguém. Nem mesmo a Sandrino, que aliás zombava desses aniversários e nunca aceitava participar das cenas. Eu não tinha uma ideia precisa do que queria dizer. Sentia apenas que uma personalidade como a de minha mãe merecia um escriba. Que eu devia me dedicar a apresentar o meu melhor para um ser tão complexo. Depois de uma longa reflexão, optei por um poema em verso livre que lembrava também uma peça de teatro. Só havia uma personagem. Por suas metamorfoses, essa personagem única exprimia as diferentes facetas da personalidade de minha mãe. Ao mesmo tempo generosa, pronta para distribuir seu dinheiro aos infelizes e pronta a atormentar Adélia por um aumento de poucos francos. Emotiva a ponto de se debulhar em lágrimas pelo infortúnio de um desconhecido. Arrogante. Raivosa. Principalmente, raivosa. Capaz de matar com a arma branca de suas palavras e incapaz de pedir perdão. Durante semanas, eu trabalhei com afinco, deixando de lado minhas tarefas da escola. Eu despertava de madrugada e via a lua redonda como um queijo brie colocado na beirada da minha janela. Eu me levantava às quatro da manhã com cuidado para não chamar a atenção de minha mãe, já vestida no cômodo ao lado. Pois todos os dias que Deus fez, sem colar nem brinco, despojada como um crucifixo, minha mãe ia à missa da aurora. Ela tomava a comunhão cotidianamente e, de volta ao seu banco, ficava fletida até o Ite missa est, murmurando rezas exaltadas. O que será que ela pedia ao Bom Deus?

Depois dessas semanas de transe, o sol iluminou o dia de seu aniversário. Desde cedo, o destino me indicou com mil sinais que as coisas não aconteceriam como eu desejava. Infelizmente, eu era uma criança cega e teimosa. Em Dubouchage, as alunas preferidas não conseguiram se lembrar dos elogios e, de boca aberta, se balançaram de um pé para o outro como peruas, disse-lhes minha mãe. Na hora do almoço, meu pai entregou-lhe um broche que visivelmente não agradou sua destinatária e, além disso, a espetou ao ser enganchado em seu corpete de crepe georgette. Adélia tropeçou na cozinha e esmigalhou todas as taças de champanhe. A pequena cena foi um desastre apesar da energia daqueles que assopraram as falas. Os raríssimos aplausos de minha mãe expressaram sua desaprovação. Só restava a minha criação para reparar a honra perdida da família.

Esse texto, evidentemente, desapareceu e não consigo dizer o que continha exatamente. Lembro-me de que estava recheado de referências à mitologia clássica, já que, nas aulas do sexto ano, estávamos estudando “O Oriente e a Grécia”. Em sua primeira metamorfose, minha mãe era comparada a uma das irmãs górgonas, a cabeça coroada de uma cabeleira de serpentes venenosas. Na segunda, a Leda, cuja doce beleza seduziu o mais poderoso dos deuses. Assim que comecei a falar, os rostos de meu pai, de minhas irmãs, das amigas de minha mãe e mesmo de Sandrino desmoronaram, revelando surpresa, perplexidade, incredulidade. Mas a bela máscara de minha mãe ficou impassível. Sentada ereta em sua poltrona, ela estava em uma pose que gostava: a mão esquerda apoiada no pescoço sustentava o queixo. Seus olhos estavam semicerrados como se concentrada para ouvir melhor.

Vestida com uma túnica azul celeste, eu me exibi e falei diante dela durante três bons quartos de hora.

De repente, ela fixou o olhar em mim. Seus olhos estavam cobertos de uma película brilhante. Logo ela se desabou e lágrimas desenharam caminhos ao longo de suas bochechas maquiadas.

— É assim que você me vê? — perguntou sem raiva.

Em seguida, levantou-se, atravessou o salão e subiu para o seu quarto. Eu nunca tinha visto minha mãe chorar. Nem mesmo quando ela quebrou o osso do braço ao escorregar na escada. Eu experimentei primeiro um sentimento inebriante que se assemelhava ao orgulho. Eu, dez anos, a caçulinha, havia dominado a fera que ameaçava engolir o sol. Eu havia parado os bois de Porto Rico em pleno galope. Depois, o desespero me tomou. Bom Deus, o que eu havia feito? Eu não tinha aprendido minha lição. Meus conflitos com Yvelise não foram suficientes. Não se deve dizer a verdade. Nunca. Jamais. Àqueles que amamos. Devemos pintá-los com as cores mais brilhantes. Deixar que admirem a si mesmos. Fazê-los crer que são aquilo que não são. Corri para fora do salão, subi a escada de quatro em quatro degraus. Mas a porta do quarto de dormir de minha mãe estava fechada. Apesar de eu berrar, bater à porta com murros e pontapés, ela não se abriu.

Passei a noite chorando.

No dia seguinte, minha mãe fingiu me tratar como sempre. Não me penteou com uma mão mais rude e prendeu minhas quatro tranças com um laço rosa. Fez brilhar minhas pernas com um pouco de óleo de rícino. Ela me fez revisar as lições. Quando, chorando todas as lágrimas do meu corpo, eu enlacei seu pescoço com meus braços, explicando que não tinha sido por mal e lhe pedi perdão, ela me questionou de maneira glacial:

— Perdão? Por que perdão? Você disse o que pensava.

Essa calma dava a justa medida de sua ferida.