[N. 123 | 2024]

As tarefas domésticas

Natalia Ginzburg

Sem poder dormir, a velha mãe costuma se levantar, desce à cozinha e prepara um café enquanto ainda está escuro. Depois senta no sofá da sala de jantar, fica ali fumando e espera o dia amanhecer.

Ela gostaria de começar logo as tarefas domésticas: varrer as escadas, lavar o chão, limpar portas e janelas. Não pode, pois todos dormem; e essas ações em que pensa e que não executa queimam-na como fogo frio. Quando jovem, era desorganizada e preguiçosa; envelhecendo, ficou com mania de organização e com uma espécie de amor torpe pelas tarefas domésticas; os filhos, as noras e os amigos costumam censurar essa sua paixão, a definem como um sinal degradante e deplorável de velhice e pobreza de espírito. As tarefas domésticas são para ela, eles dizem, um álibi para não fazer coisas diferentes e mais nobres: ler, acompanhar a política, estudar. A velha mãe nunca entendeu nada de política, na cabeça tem apenas três ou quatro pensamentos, ásperos e persistentes, e os cultiva quando está no sofá fumando ou enquanto executa as tarefas domésticas com fúria.

Em geral, por volta de seis e meia as crianças acordam, filhos de seus filhos, que passam os meses de verão com ela. A velha não se move do sofá; fica ali à espreita como um abutre com as garras pousadas sobre uma rocha. Fuma, cultiva seus quatro pensamentos e fica olhando através dos vidros as oliveiras e parreiras imersas na névoa da manhã.

Em uma época remota e muito feliz, a mãe ainda jovem e não vencida pelas desgraças tirava os filhos da cama, os lavava, dava-lhes café com leite e os levava para passear. Sua mãe lhe havia ensinado que isso tudo era essencial. Ela lembra ter sido, como já mencionado, desorganizada e preguiçosa; mas em sua desorganização havia um pensamento inabalável: que as crianças tinham de se levantar assim que acordassem, que deveriam ser ensaboadas com força, pulverizadas com talco e, depois do café com leite, levadas para tomar o primeiro e fresco sol da manhã.

Hoje ela gostaria de fazer o mesmo com os filhos de seus filhos, mas uma operação assim tão simples, como acordar essas novas crianças e dar banhos nelas, não lhe é permitida. Essas novas crianças mantêm, em seus quartos, biscoitos e gibis; vão levantar mais tarde, quando elas mesmas decidirem; vão zanzar pela casa com seus pijamas de malha, vão espalhar revistinhas e biscoito em cima dos pais ainda imersos no sono.

Enfim, mães e pais também acordam, se levantam e descem à cozinha, desgrenhados e descalços: não usam chinelos ou não se preocupam em procurá-los embaixo da cama; a velha mãe se pergunta por quanto tempo ainda haverá fábricas de chinelos, visto que as pessoas parecem julgá-los inúteis. Ainda tropeçando no sono, os jovens pais e mães procuram pão e xícaras pela cozinha. Começa um longo e caótico café da manhã, sem café com leite: o café com leite, assim como os chinelos, parece estar desaparecendo da face da terra. Circulam ovos mexidos e sucos de fruta de caixinha; e uma substância horrível, escura e gordurosa que passam no pão e que se chama Nutella.

Perguntam às crianças o que elas querem comer; não sabem, e a indecisão as faz chorar; o sol já está quente lá fora e a velha mãe pensa que as crianças já deveriam estar no sol havia muito tempo; fica quieta, porque a esta altura já se acostumou a ficar quieta; pensa que o modo como essas novas crianças são criadas é muito complicado e cansativo; o modo antigo talvez fosse autoritário e descuidado; naquela ação de tirá-los da cama assim que acordavam, dar banho e levá-los ao ar livre talvez houvesse, como dizem hoje seus filhos, prepotência e dominação; a velha mãe se pergunta se até o café com leite era prepotência: ela mesma detestava, mas achava bom quando quem bebia eram seus filhos.

Enquanto isso os jovens pais e mães se decidem se vão ficar o dia todo na praia ou só de manhã; parecem ignorar que a esta altura a manhã quase acabou. Decidem sobre qual praia e com que automóvel vão; a mãe pensa que o traço que define os jovens de hoje é a indecisão. A indecisão dos pais acaba envolvendo as crianças: choram, pois a indecisão os exaspera; misturam às incertezas dos pais suas próprias incertezas, perguntam às lágrimas como deverão se vestir e que brinquedos deverão levar; de repente os pais ficam bravos, na raiva adotam um tom trágico; esses novos e jovens pais e mães não costumam gritar com os filhos, mas quando perdem a paciência acham que têm de fazer uma expressão trágica: as crianças soluçam, os pais já arrependidos se afastam com os filhos e não os consolam, mas lhes dão, sussurrando secretamente, explicações difusas sobre o próprio comportamento. A velha mãe pensa que as broncas rápidas, instintivas e distraídas, furiosas e logo depois esquecidas, são outra coisa que desapareceu da face da terra. Enfim eles se vão cheios de boias, baldinhos, toalhas e sacolas; e a velha mãe pensa que poderá realizar as tarefas domésticas.

Na porta, noras e filhos ordenam-lhe que não faça nada; nos quartos tudo já foi feito, eles dizem. A mãe, assim que eles saem, vai aos quartos: com um prazer torpe e selvagem põe abaixo as camas já arrumadas e recolhe regatas e revistas. A quantidade de camisetas é infinita; estão em todos os cantos da casa, manchadas de frutas e impregnadas de areia; e é infinita a quantidade de revistas, que deixam espalhadas por todos os lados por onde passam. A mãe sabe que no inverno eles vivem de forma diferente; filhos e noras trabalham, as crianças talvez tomem banho assim que acordam e são levadas à creche. A indecisão é um fruto das férias; explode no verão, mas talvez esteja sempre escondida na vida dos jovens, como um instinto de férias eternas em que o tempo definha em meio a rios de palavras gratuitas.

Outrora, ao executar as tarefas domésticas, a mãe nutria o desejo secreto de que os familiares elogiassem sua rapidez e eficiência; mas os elogios nunca vieram, só reclamações, comentários chatos e julgamento severos; os filhos mandaram-na parar com essa bobagem de fazer faxina; eles viveriam igualmente bem, disseram, em uma casa onde o chão não fosse lavado todos os dias. Assim, ao lavar o chão, a mãe fica em dúvida se está fazendo uma coisa inútil: de fato, é verdade que o chão não precisaria ser lavado todos os dias. Ela, quando jovem, não o lavava nunca; na época havia empregadas que o lavavam muito bem; e sua própria mãe não podia conceber a ideia de que fosse possível morar em uma casa onde as empregadas não lavassem o chão todos os dias. Mas hoje não existem mais empregadas; e, se existem, são figuras tão evanescentes e instáveis que o receio de perdê-las é mais forte que o desejo de que lavem o chão. Quanto aos jovens, eles pensam que não é certo ter empregadas; e no caso de se ter uma, nunca será possível impor-lhe que lave o chão, pois se trata de uma mortificação do espírito que não deve ser imposta a vivalma, e deve ser cumprida, excepcionalmente, uma vez por ano.

Lavando o chão com fúria, a mãe se pergunta por que faz isso, uma coisa talvez de fato inútil e mortificante; se pela memória da própria mãe, se por um prazer estéril e doentio. Não é por amor à casa, ela já entendeu que não se importa nem um pouco com a casa. O que lhe importa neste mundo são os filhos e suas doces e encaracoladas crianças: pessoas às quais não interessa nem um pouco se o chão está lavado ou não.

A mãe senta no sofá, fuma, olha as oliveiras e videiras ardendo sob o sol do meio-dia. Agora estão voltando com suas boias, toalhas úmidas e impregnadas de areia, suas camisetas sem manga, pedaços de pão e revistas: a bagagem desse rebanho lentíssimo, feliz e indeciso. A mãe se pergunta se, depois que ela morrer, alguém vai lavar o chão da casa.

Agosto, 1969,