a maré subiu, sobe maré
a maré desceu, desce maré
A despeito de constar como tópica relevante na produção literária de mulheres negras desde o século XIX, haja vista a obra da precursora
Maria Firmina dos Reis,
a maternidade negra segue sub-representada na discursividade nacional (e aqui estendo a constatação para além da literatura).
Habitar um país que, de inúmeras e perversas formas, insiste em
obliterar
o direito
ao exercício
da maternidade
e a uma assunção da maternidade como
prática-sentido dissonante
do legado ocidental aqui cravado é uma constrição que matiza a experiência das mulheres aqui reunidas.
Mulheres mães negras em movimento.
No corre da poesia, da academia, da editoração, da docência, da cozinha, da tradução, da cura, da costura, da resiliência por um bem-viver, estão elas. Elas que atendem ao meu chamado,
eco sonante de Glória Anzaldúa,
ponto contínuo da tessitura de Lélia González e de Beatriz Nascimento,
esta que nos deixou tão cedo, mas frutificou Bethania, a quem testemunhamos e cuidamos, com quem nos emocionamos pela beleza de um rond de jambe.
Essa curadoria foi assim, um tanto dançada no propósito de não se ser só (mãe);
um tanto doída pela escuta (ativa) de se ser mãe (escura) nesse plano-geo-espaço-simbólico;
um tanto cifrada pelas perguntas que nos fazem(os) enquanto sujeitas de existências ressignificadas por outrens, nossos filhos-filhas-filhes-frutos.
Ser mãe
como questão, suspensão e atualização de um trajeto ancestral,
Mãe
a mover-se a favor da maré, em aprendizado íntimo com o ritmo das águas,
Brilho
daquele interstício em que, já batizadas pelo sal, as águas doces produzem, de sua fricção com o ar, fagulhas de luz.
A maré subiu, sobe maré
A maré desceu, desce maré