[N. 167 | 2025]

Contínuo [fragmento]

Sarah Manguso

Então me tornei mãe. Comecei a habitar o tempo de outro jeito. Tinha algo a ver com a mortalidade. Continuei escrevendo o diário, mas minha preocupação em relação às memórias perdidas começou a arrefecer.

Amamentar um bebê cria tanto tempo perdido, vazio. Da mamada noturna do bebê eu não me lembro de nada. Da mamada diurna não me lembro de quase nada.

Era um nada diferente do nada não registrado dos anos anteriores; esse nada estava ausente de experiências subjetivas. Eu estava ou dormindo ou quase dormindo todo o tempo.

Dia e noite consistiam na entrada e saída de leite, e frequentemente numa emergência, mas todas as emergências se pareciam. Ao amanhecer eu encontrava uma pilha de pequenos cobertores úmidos e pequenas roupas úmidas no chão do quarto. Mas nunca me lembrava de ter trocado a blusa verde pela amarela.

Na minha experiência, amamentar é esperar. A mãe se torna o pano de fundo contra o qual o bebê vive, se torna o tempo.

Eu costumava existir contra a continuidade do tempo. Depois me tornei a continuidade do bebê, um pano de fundo de tempo contínuo contra o qual ele podia viver. Eu era o calor e o leite que estava ali para ele sempre, o agente de conforto que estava ali para ele sempre.

Meu corpo, minha vida, se tornou a paisagem da vida do meu filho. Eu não sou mais simplesmente uma coisa vivendo no mundo; eu sou um mundo.