curadora convidada
Maria Carolina Fenati
Estão reunidos nesta curadoria textos de quinze mulheres, escritos durante a pandemia da Covid e publicados na coleção Caderno de Leituras, das Edições Chão da Feira, em outubro de 2020 e em setembro de 2021. O confinamento, o convívio contínuo com as crianças, a exaustão, a invenção de outras formas de cuidado, a tragédia na esfera pública, a sobrevivência no mundo íntimo – estas e outras figurações da experiência da maternidade durante aqueles tempos estão na escrita dessas mulheres que, quase sempre diante dos seus filhos, viam o que acontecia no seu íntimo e no mundo, sabendo que era preciso narrar e não esquecer, narrar e inventar outras formas de continuar.
  • Contínua

    Maria Carolina Fenati

    Quando estávamos no início da pandemia da Covid-19 e lavávamos pacotes de arroz ou economizávamos álcool em gel pensando nos hospitais, enquanto o governo brasileiro não se responsabilizava por adquirir e desenvolver vacinas e fortalecer o Sistema Único de Saúde, quando todos nós esvaziávamos as ruas e ficávamos confinados em casa, acuados com as nossas […]

    ler: Contínua
  • Estava abertamente tentando florear o começo de nossos dias com novas experiências, sucos, mudança diária do cardápio no café da manhã. Nossa religião de quarentena – porque o tempo, que vem engolindo de maneira dolente, se tornou uma espécie de presente contínuo. Poucas vezes tive tanta dificuldade de escrever como aqui. […]

    ler: Raiz centrífuga: eu, o quadrado, o cosmos e o pequeno
  • Na ilha, algum farol

    Roberta Ferraz

    Acabo de sair de um encontro virtual com outras mulheres, no qual lhes disse, comovida, que a maternidade me bagunçou completamente. Comecei a escrever este texto sob o impacto dessa conversa e de dentro de um confinamento, devido à pandemia de Covid-19, que já soma 86 dias, a grande maioria deles vivida no meu apartamento, […]

    ler: Na ilha, algum farol
  • Gosto muito de contar as histórias de minha avó, de como minha mãe herdou os seus cheiros de lavadeira, doceira; de que fazia a própria massa e o molho do macarrão. Gosto de furtar histórias também, como aquela de a vovó amar mulheres e só ficarmos sabendo
    no dia em que Joaquim, meu primo indiscreto, […]

    ler: Origem, confinamento
  • os dias passam sempre iguais
    e repetem
    e repetem
    e repetem o menino reclama ao longo do dia
    chora por causa do agora ouço minha vizinha gritar exausta
    que não aguenta mais essa menina
    nojenta […]

    ler: Os dias (não) passam sempre iguais
  • Começo e violência

    Marina Guimarães

    Não quis marcar a data do parto do meu segundo filho. Na minha primeira gravidez, cheguei à 42ª semana sem contrações nem nenhum “sinal de parto”, e o médico indicou a cesariana. Os índices de cesariana no Brasil chegam a 95%, o maior índice de todo o mundo. Entrei para essa estatística. […]

    ler: Começo e violência
  • Eu começaria e terminaria da seguinte forma: por causa da maternidade e do isolamento social, não pude escrever este texto. … Há um caderno de anotações em todos os lugares da casa. Em cada canto um. Todos vazios. Ou com frases soltas. Palavras que parecem vagar. Alumbramentos, receios, angústias, alegrias e descobertas. […]

    ler: Bloco de notas para a memória de uma mãe em construção
  • Pontos de Nós

    Mari Polke

    Mãos, gestos, linhas visíveis e invisíveis. Um ponto ligado ao outro. Tenho pensado muito sobre as mãos. Em algum momento da pandemia, uni as pintas do meu braço com uma canetinha rosa, assim como meu filho riscou a parede em um ataque de fúria. Mamãe, você está mais calma agora? […]

    ler: Pontos de Nós
  • Escrever um texto sobre maternidade e pandemia? Sobre Gil e a falta de tempo? Sobre política, persistência, cotidiano? Não sei como desviar desse tema nem do quanto me ocupou a diferença entre homens e mulheres na distribuição dos cuidados da domesticidade. Esgueiro-me ao redor do tema: nenhuma iluminação nem cheiro de fagulha […]

    ler: Belo Horizonte, 30 de julho de 2021
  • Do dentro do nosso quintal

    Fabiana Carneiro da Silva

    Dou um xêro na barriga e ganho um cafuné. Dengo bom que me distraiu e eu nem vi o passar do tempo, dois anos desde aquele dia em que me rasguei para recebê-la. Naqueles primeiros dias, minha menina se fazia urso em inverno. Hoje, somente uma soneca rápida ao longo do dia. […]

    ler: Do dentro do nosso quintal