mulher-negra

  • Da dor e do amor

    Dulci Lima

    Nascemos. Em abril de 2013, minha filha e eu nascemos, ela para o mundo e eu como mãe. Nunca almejei ser mãe, não sonhei ter filhos. Gostava mais das brincadeiras de rua e de professora do que de bonecas. Amava mesmo os livros!
    Minha filha foi um acontecimento inesperado, resultado de um amor não correspondido […]

  • Canções puerperais

    Daisy Serena

    eu queria escrever uns versos pra matar o tempo, a saudade, a vontade. pra saciar a sede, o desespero, a febre, o silêncio. eu queria escrever umas palavras ainda que soltas, qualquer coisa que me lembrasse que eu ainda tô aqui, aqui, aqui dentro, como eu tô fora, fervendo.
    mas meu filho acordou dez vezes […]

  • A ira da filha de cam
    parece perda de palavra
    que
    mucama
    num é quem ama
    é qual a
    mulata
    bicho que se quer
    domesticado […]

  • [O relógio…]

    Barbara Uila

    O relógio
    seguindo passos de
    antes –
    sufocou feridas.
    Pedaços da renda da
    toalha de mesa embranquecendo
    o assunto do almoço
    o vai e vem de panelas fumegantes
    pra embalar uma fome ancestral […]

  • Do desfiar ao tecer – Manto materno

    Assunção de Maria Sousa e Silva

    Minha avó Salu tinha um ofício cuidadoso. Quando menina, trabalhava no roçado: roçava, semeava, colhia, quebrava coco… Quando jovem, casou-se, teve cinco filhos e, com a reviravolta do tempo, ficou viúva e voltou à roça para sustentar os filhos, à mesma labuta na agricultura e pecuária […]

  • Toda a dor do passado
    as sementes germinadas
    no útero de minhas avós
    nutridas com seu sangue
    suas lágrimas e sua força
    eu carrego
    os frutos de sua carne
    galhos
    trilhas tortuosas
    tronco firme também […]

  • Ela cresce

    Anajara Tavares

    Foi ontem que aquele cheiro
    Invadia as minhas narinas
    E ela saía das entranhas de mim…
    Coroou-me minha menina. Não tem muito tempo que ela, semente,
    Se encaixava perfeitamente
    Entre meu seio farto e o umbigo,
    E mal pesava na cunha de minhas mãos,
    Seu novo abrigo. […]

  • Um dia, quando você sentar na beira da calçada para amarrar o cadarço dos sapatos, há de lembrar-se de mim, ajoelhada, diante de você. Calço seus pés, miro-lhe o riso, lavo o seu corpinho preservando beneditinamente cada instante. Há de achar que eu nunca tive um medo.  […]

  • Com-a-maré

    Fabiana Carneiro da Silva

    a maré subiu, sobe maré
    a maré desceu, desce maré
    A despeito de constar como tópica relevante na produção literária de mulheres negras desde o século XIX, haja vista a obra da precursora  Maria Firmina dos Reis, a maternidade negra segue sub-representada na discursividade nacional […]