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  • .: Mãe: A ruptura e o vínculo

    Mãe: A ruptura e o vínculo

    Stephanie Boaventura
    N.226 | 2025

    Há muitos anos, uma tia ardilosamente me contou, em tom de segredo familiar devastador, que minha mãe, quando grávida de mim, havia contemplado a possibilidade de fazer um aborto. A ideia de interromper a gestação, depois eu descobri, circulou por muitas mentes envolvidas no evento, mas sua autoria não foi reclamada por ninguém. O inconfessável, o ato monstruoso! Havia, no entanto, um outro lado dessa história que a ninguém, nem mesmo a minha mãe, ocorreu ponderar: quando descobriu a gestação que culminaria em meu nascimento, ela tinha apenas dezesseis anos.

  • .: Fímbria

    Fímbria

    Pi Rossi
    N.225 | 2025

    Sentadas numas cadeiras azuis de plástico, uma mulher grávida e sua mãe aguardam o chamado do médico. A mulher conserva algo de menina: seu jeito, a roupa rosa bebê com dourado. Está aérea, quase fora de si. A mãe coleciona rugas e o cansaço de uma segunda – talvez terceira – gravidez; zela de perto a filha. Há algo de mãe na menina, ainda que seja apenas um sopro: um murmúrio baixo, distante e incessante em seus ouvidos, que a distrai a todo momento. Penso na minha mãe, que não sabe que estou ali esperando uma consulta também, mas uma consulta diferente. Ou sou eu que me sinto diferente, muito distante daquelas mulheres na minha frente. Eu também tenho medo. E o mesmo nervosismo.

  • .: Falta hereditária

    Falta hereditária

    Giovanna Genghini
    N.224 | 2025

    Há um mal que assola a minha família, entre mães, filhas e hospitais psiquiátricos. Minha avó se internou num hospício nos anos 1980. Até hoje não se fala disso, não sabemos por quê. Ela não foi boa mãe: uma vez arremessou um sapato de salto na testa da filha. Levaram minha mãe criança para um hospital. Na época, não havia ECA. Inventaram uma desculpa e passou batido. Minha mãe sempre chora e diz que não teve amor de mãe. Acho que minha avó não aprendeu a amar os filhos, só os teve.

  • .: Gesto de gravidade [fragmento]

    Gesto de gravidade [fragmento]

    Anna Luara da Silveira
    N.223 | 2025

    as mãos são ímãs
    deslizam magnéticas
    até o ventre
    gesto de gravidade

    ali
    um nadinha de toneladas
    a consciência da vida pesa

  • .:  Letras 

     Letras 

    Izabel Haddad
    N.222 | 2025

    desejo escrever
    me falta coragem de encarar o ritual do desencontro
    um mar de recuos
    receio e deixo o lápis mudo
    o papel impuro
    tenho medo de que veja nas frestas de ínfimos abismos
    o que do outro não se deve ver

  • .: Minha mãe

    Minha mãe

    Patrícia Franca
    N.221 | 2025

    Não me ensinaram a falar
    deram-me de pedir sem vestes.
    Não me ensinaram a fugir
    deram-me de ter rédeas caídas.
    Não me ensinaram a escrever
    deram-me de talhar uma tábua sobre o rio.

  • .: A filha

    A filha

    Tatiane Jesus
    N.220 | 2025

    Chora
    Pede colo para a mãe
    O telefone toca
    O leite derrama
    A menina febril
    Na carteira não há dinheiro
    Onde está o papai?
    Pergunta a filha
    Não pôde vir, diz a mãe

  • .: Oração

    Oração

    Ceres Soares Bifano
    N.219 | 2025

    Que meu corpo se livre do peso da impossibilidade de atender ao desejo do outro.
    Que meus braços abracem o mundo e por enquanto alcancem um pouco, mas apenas um pouco além do que eu acreditava ser possível.
    Que minhas mãos teçam, amassem, moldem, pintem, escrevam, que meus dedos apontem, entrelacem.
    Que meus olhos repousem fechados, mas que abertos estejam atentos para o céu, para os próprios movimentos, para outros olhares… bem fundo, entregues.
    Que minha boca profira o que for necessário para que eu não me engasgue com as palavras, mas que cuide de quem ouve.
    Que meus ouvidos ouçam tudo, mas que escutem com cuidado, e que venha para o peito o que é meu.

  • .: Niketche, uma história de poligamia [fragmento]

    E esse Deus, se existe, por que nos deixa sofrer assim? O pior de tudo é que Deus parece não ter mulher nenhuma. Se ele fosse casado, a deusa – sua esposa – intercederia por nós. Através dela pediríamos a bênção de uma vida de harmonia. Mas a deusa deve existir, penso. Deve ser tão invisível como todas nós. O seu espaço é, de certeza, a cozinha celestial.