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Observar qualquer ser humano desde a infância, ver alguém surgir, como uma nova flor em botão, cada pétala primeiro enrolada bem apertada nas outras, e depois o afrouxamento natural e o desvelamento, a abertura em uma floração, a vida dessa floração, deve ser algo incrível de se ver; observar a experiência se acumular nos olhos, nos cantos da boca, o desabar da testa, o peso no coração e na alma, a aglomeração de gordura na cintura, nos peitos, o desacelerar dos passos não pela velhice mas apenas pela cautela da vida — tudo isso é algo tão maravilhoso de se assistir, tão maravilhoso de se ver
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O amor faz você funcionar como redondo relógio de ouro.
A parteira bateu em seus pés, e seu grito nu
Tomou lugar entre os elementos.Nossas vozes ecoam, exaltando sua chegada. Estátua nova
Num museu arejado, sua nudez
Assombra nossa segurança. Ficamos ao redor, brancos como
paredes. -
Cecília flagrou Eva chorando no banheiro. Um de seus brinquedos de pelúcia estava jogado na privada. Ninguém viu como ele foi parar lá. A mãe pegou a menina no colo e a levou para o seu quarto, disse que não tinha problemas, logo iriam a uma loja comprar um novinho. Eva, que estava inconsolável, foi se acalmando e se voltou a outra distração.
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Há muito tempo eu nasci.
Já não há ninguém vivo
que se lembre de mim quando bebê.
Eu era um bebê bonzinho? Ou
difícil? A não ser na minha cabeça,
essa questão está agora
silenciada para sempre. -
Ela diz que não gosta de sexo: há qualquer coisa naquilo que a envergonha, que a faz sentir-se ridícula. Tudo lhe parece estranho: preliminares, o tamanho do pénis, o arfar do homem, a queda do orgasmo. Tem vergonha do corpo: embora saiba que é bonita, não gosta do peito, caído, um seio mais pingado que o outro. Diz que passa por aquilo porque é o preço a pagar pelo amor que deseja. Se pudesse, em vez de sexo, faria o jantar – um jantar demorado, condimentado, para várias pessoas. O que ela queria era uma família, era muita gente na mesa, as vozes umas em cima das outras, lutando por se fazerem ouvir – e ela também.
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Sempre que penso no momento em que descobri que estava grávida, vejo-me em frente ao Centro Comercial de São Marcos, embora saiba que o laboratório era no Cacém, e que foi lá, na sala de espera, que abri o envelope. Mas talvez só tenha agarrado no telefone aí, à saída do supermercado, enquanto subia as escadas exteriores, vinda da paragem do 140. Tinha sido naquele centro comercial que, com quinze ou dezasseis anos, informara os meus amigos de que nunca teria filhos.
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Faz duas semanas que estamos aqui e não tive vontade de escrever desde aquele primeiro dia.
Agora estou sentada junto à janela, neste atroz quarto infantil, e não há nada que me impeça de escrever o quanto queira, exceto a ausência de forças.
John fica fora o dia todo, às vezes também à noite, quando os casos são mais graves.
Fico contente que meu caso não seja grave!
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O legado duradouro da escravidão nos corpos das mulheres negras nas Américas resultou, de forma visível, em algumas das taxas mais baixas de amamentação e, o que é ainda pior, em uma crise de mortalidades infantil e materna. As disparidades raciais que persistem ainda hoje (sobretudo na área da saúde) são efeitos em cascata da propagação das incontáveis violências físicas, psicológicas e sexuais sofridas pelas mulheres negras por séculos, enquanto desempenhavam funções domésticas e agrícolas na condição de escravizadas.
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Minha mãe tinha duas caras e uma frigideira
na qual ela preparava suas filhas
para serem meninas
antes de cozinhar nosso jantar.
Minha mãe tinha duas caras
e uma panela quebrada
onde ela escondia uma filha perfeita
que não era eu
eu sou o sol e a lua e eternamente faminta
pelos olhos dela.