• Carta em Matrioshka

    Camila Parducci
    N.58 | 2023

    Vó,
    Como você está?
    Por aqui, as coisas vão crescendo, meus planos tomando forma e me sinto mais ativa de novo. Não que antes estivesse parada, o que acontece agora é que estou tendo mais espaço para mim. Minha bebê começou a andar, está mamando menos, consegue ficar mais tempo com outras pessoas

  • Línguamãe

    Cacau Araújo e Gabriela do Amaral
    N.57 | 2023
  • A criança cristal

    Rivka Galchen
    N.56 | 2023

    Minha mãe me contou que as pessoas lhe dizem, quando ela está na rua com a bebê, que a bebê é uma criança cristal. Algumas pessoas pedem permissão para tocar a bebê, porque o contato com crianças cristais cura. “Você deveria pesquisar o que é uma criança cristal”, já me disse várias vezes minha mãe, que tem mestrado em ciências da computação e graduação em matemática. Desde o primeiro momento que viu a bebê, minha mãe achou que ela era uma criatura superior e excepcional; atribuir qualidades de criança cristal a ela faz parte dessa história em curso.

  • Visível e invisível

    Lilia Moritz Schwarcz
    N.55 | 2023

    Registros sobre a existência de escravizados e escravizadas em São Paulo remontam aos primórdios da colonização. Nos séculos XVI e XVII, e na maior parte do XVIII, a presença de africanos era basicamente inexpressiva, sobretudo devido à prática da policultura voltada para a subsistência, largamente baseada na mão de obra indígena.

  • Ana de Amsterdam [fragmentos]

    Ana Cássia Rebelo
    N.54 | 2023

    21 DE SETEMBRO DE 2007

    O ginásio é antigo, de madeiras escuras, tectos altos de estuque trabalhado. Há retratos dos primeiros presidentes da colectividade pendurados nas paredes. Senhores gordos, com bigodes retorcidos e cabelo puxado com brilhantina. Em Cuba, imagino, deve ainda haver muitos ginásios como este, com cheiro de óleo de cedro.

  • Estava abertamente tentando florear o começo de nossos dias com novas experiências, sucos, mudança diária do cardápio no café da manhã. Nossa religião de quarentena – porque o tempo, que vem engolindo de maneira dolente, se tornou uma espécie de presente contínuo.

    Poucas vezes tive tanta dificuldade de escrever como aqui.

  • Na ilha, algum farol

    Roberta Ferraz
    N.52 | 2023

    Acabo de sair de um encontro virtual com outras mulheres, no qual lhes disse, comovida, que a maternidade me bagunçou completamente. Comecei a escrever este texto sob o impacto dessa conversa e de dentro de um confinamento, devido à pandemia de Covid-19, que já soma 86 dias, a grande maioria deles vivida no meu apartamento, em São Paulo. Terminei ainda dentro desse confinamento, no dia em que Heitor, meu filho, completou 9 meses e 5 dias.

  • Origem, confinamento

    Nina Rizzi
    N.51 | 2023

    Gosto muito de contar as histórias de minha avó, de como minha mãe herdou os seus cheiros de lavadeira, doceira; de que fazia a própria massa e o molho do macarrão. Gosto de furtar histórias também, como aquela de a vovó amar mulheres e só ficarmos sabendo
    no dia em que Joaquim, meu primo indiscreto, contaria tudo sobre eu estar de amores com uma mulher…

    Tenho um confinamento na minha origem.

  • Os dias (não) passam sempre iguais

    Mika Andrade
    N.50 | 2023

    os dias passam sempre iguais
    e repetem
    e repetem
    e repetem

    o menino reclama ao longo do dia
    chora por causa do agora

    ouço minha vizinha gritar exausta
    que não aguenta mais essa menina
    nojenta